As alterações climáticas são, hoje em dia, um dos maiores, se não mesmo o maior desafio da humanidade. Estas devem-se a causas naturais ou humanas. No entanto, a meu ver, não são mais do que o resultado do efeito “bola de neve” associado aos desperdícios (de recursos, de matérias-primas) e ao agravante consumismo da sociedade, que resultam num aumento das emissões de Gases de Efeito de Estufa (GEE).
A digestão anaeróbia é um processo de decomposição da matéria orgânica na ausência de oxigénio pela acção de bactérias (microrganismos acidogénicos e metanogénicos). Trata-se de um processo simples, que pode ocorrer naturalmente em quase todos os compostos orgânicos (ex: lago estagnado, em aterros, abaixo da camada de gelo na Sibéria, etc.). Esta é utilizada nos sistemas de tratamento de águas residuais, sendo o principal objectivo a estabilização de lamas primárias e secundárias. Os produtos derivados da digestão anaeróbia, ou seja, os resíduos gerados, são o biogás (constituído, essencialmente, por metano, CH4, e dióxido de carbono, CO2), uma pequena quantidade de biomassa bacteriana (lama digerida) e um efluente digerido. O efluente gerado pelo processo pode ser usado como fertilizante.
A composição do biogás pode ser variada, dependendo sobretudo das características do resíduo e as condições de funcionamento do processo de digestão anaeróbia. Em geral, o biogás é constituído por 60% de CH4 e 40 % CO2. Outros gases como o azoto, (N2) e sulfureto de hidrogénio (H2S), estão também presentes na mistura, embora em quantidades muito reduzidas, ou até mesmo vestigiais.
O processo de digestão anaérobia é descrito em três etapas, sendo que a primeira consiste na dissolução e hidrólise de moléculas orgânicas de grande dimensão, como os glúcidos, os prótidos e os lípidos, transformando-as em açúcares, aminoácidos, glicerol e ácidos gordos. Seguindo-se a fase acidogénica, nesta participam os microrganismos bacterianos anaeróbios, que transformam os produtos provenientes da primeira fase em compostos de baixo peso molecular e gases com poder corrosivo, como H2S, originado maus odores. Por último dá-se a metanogénese, onde os ácidos voláteis produzidos nas fases anteriores são degradados pela acção de bactérias metanogénicas, tendo como produto final o biogás.
De um modo geral, o biogás assim produzido é simplesmente queimado, evitando o lançamento de metano para a atmosfera, onde é fortemente nocivo em termos de efeito de estufa, aproximadamente 21 vezes mais prejudicial que o CO2 (pois a força da ligação covalente carbono-hidrogénio do metano é mais forte que a do carbono-oxigénio do dióxido de carbono, possuindo um potencial de aquecimento extremamente elevado quando comparado com o CO2). No entanto, este deve ser considerado como um subproduto útil, susceptível de ser aproveitado energeticamente.
O interesse do biogás como recurso energético deve-se ao seu principal constituinte, devido ao elevado poder calorífico. A queima deste combustível confere uma grande vantagem na produção combinada de energia térmica e energia eléctrica – co-geração. Um sistema de co-geração de 500 kW permite converter cerca de 33% da energia contida no biogás em energia eléctrica, e aproximadamente 60% é recuperado sob a forma de calor (vapor e água quente). As perdas associadas ao processo de go-geração são muito reduzidas, estas rodam, aproximadamente, 7%.
Estima-se que, caso todos os resíduos orgânicos mundiais sofressem um processo de digestão anaeróbia, e fossem convertidos em biogás e, consequentemente, aproveitados como combustível, com uma eficiência de 50%, seria possível uma redução de cerca de 5% da energia fóssil.
As principais áreas potenciais de produção de biogás, centram-se nos sectores industrial (efluentes da indústria alimentar e do papel), urbano (efluentes provenientes das Estações de Tratamento de Águas Residuais, ETAR’s, e aterros de RSU) e agrícola (agro-pecuário).
Em Portugal o potencial de utilização desta técnica é considerável, visto existirem actualmente em funcionamento ETAR’s dotadas de digestores anaeróbios para tratamento de lamas, ainda sem aproveitamento do biogás produzido. Só para produção de energia eléctrica, estima-se que seja possível atingir uma potência, aproximada, de 100 MW a partir deste recurso renovável.
De entre todas as formas de energia renovável, as que permitem valorizar os resíduos são as mais nobres, pois aliam à geração energética uma componente ambiental positiva, a redução dos resíduos gerados. O biogás originado a partir de efluentes agro-pecuários, agro-alimentares, ETAR’s e RSU pertence a este grupo.
Vantagens da utilização da digestão anaeróbia para produção de biogás:
i. Tratamento de efluentes:
- É um processo natural para o tratamento de resíduos orgânicos;
- Requer menos espaços que os aterros sanitários ou a compostagem;
- Diminui o volume de resíduo a ser eliminado.
ii. Fonte energética:
- Fonte de energia renovável;
- Produção de um combustível com elevada eficiência.
iii. Protecção do Ambiente:
- Maximiza os benefícios da reciclagem e reaproveitamento da matéria orgânica;
- Produz como resíduo um biofertilizante, rico em nutrientes, livre de microrganismos patogénicos;
- Reduz significativamente a quantidade de metano lançado para a atmosfera a partir de aterros.
iv. Económica:
- Apresenta, como qualquer energia renovável, um custo inicial mais elevado. No entanto, a médio/longo prazo esse investimento é compensado, visto que, reduz o consumo energético.
Desvantagens:
- Formação de sulfureto de hidrogénio (H2S), gás tóxico com cheiro desagradável;
- Dependendo do tipo de resíduo, a quantidade de biogás será maior ou menor, o que implica uma possível etapa de tratamento do gás obtido, dependendo do uso dado ao mesmo;
- Custo extra na manutenção devido a escolha adequada do material utilizado na construção do biodigestor, uma vez que, há formação de gases corrosivos.
O H2S, resíduo que pode ser produzido no processo de digestão anaeróbia, dependendo do tipo de matéria orgânica utilizada na produção de biogás, que apresenta características adversas para o ambiente, pode ser aproveitado na indústria de cortumes, na fase de depilação (nesta etapa utiliza-se o enxofre para dissolver os pêlos). Em todo o caso, a melhor forma de utilização deste será convertê-lo em enxofre, podendo ser posteriormente utilizado na agricultura como nutriente.
Em suma, o biogás, produzido a partir da digestão anaeróbia de resíduos orgânicos, pode ser utilizado na geração de energia eléctrica, térmica e mecânica (como fertilizante), tratando-se assim, de uma energia verde, com o pro bono de redução dos resíduos gerados, considerando-os como subprodutos.
Fonte: http://www.inverter-china.com/blog/upload/biogas.gif
1 comentário:
Olá Marta
Post muito elucidativo sobre o biocombustível, muito bem complementado pelo vídeo colocado no "Resíduos".
Parabéns
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